VIDA DE PAPEL
Rosana Skronski
Estava sossegado no meu canto, quando o
homem me abriu e me encheu de pipocas. Sem a menor cerimônia, uma mulher me
pegou e foi me levando.
Ela comia as pipocas com olhos, boca e
dentes de muita fome.
Quando acabou, meteu a boca dentro de
mim, soprou um grande sopro e eu comecei a estufar, estufar, estufar, estufar e...
Bum!!!!!!!!!!!!! Tudo chacoalhou!!!!!!!!Um terremoto?
Não
era, não! A rua continuava no mesmo lugar, com as pessoas apressadas, as
buzinas tocando... Tudo nervoso, mas normal.
A mulher deu uma gargalhada e sem mais
nem menos me deixou cair ali, no meio da rua!
Mal tinha me levantado, quando veio um
carro a toda velocidade pra cima de mim! Só me livrei daquele amasso achatante, porque uma ventania me empurrou pra calçada.
Vi um guri esquisito vindo pro meu
lado.
Ele começou a me chutar, sem a menor
consideração. Logo eu, que não tinha feito nada! Fui rolando rua abaixo até que
ele resolveu seguir em frente, sozinho. Foi embora sem nem dizer um “muito
obrigado” ou “desculpe o mal jeito”.
Fui, assim, me desviando dos pés que
ameaçavam me pisar, sem rumo nem destino, quando uma coisa peluda se aproximou.
Foi me arrastando para uma pá e da pá eu caí em uma lata. Lá dentro estava
cheio de coisas.
A casca de laranja, cheirosa como
sempre, foi logo me entrelaçando em um abraço. Um papel amassado e sujo disse
pra eu não me envergonhar por ter ficado meio amarrotado.
Estava entre amigos e senti que ali era
o meu lugar.
Um botãozinho quebrado contou que tinha
caído da blusa de uma dona em um elevador. Quase se perdeu em um tapete
felpudo.
Foi um aspirador que o salvou. Mas,
todo agitado, o botão disse que a melhor aventura vem agora: uma longa viagem
nos esperava!
Ele estava certo. À noitinha, um caminhão
bem “maneiro” me levou com minha turma. Demos adeus à amiga casca, ao bagaço de
milho e à paçoquinha embolorada. Encontramos garrafas, outros papéis, latinhas
charmosas e vidros bons de papo.
Fomos parar em um lugar grande, com
esteiras e máquinas.
Fiquei tão amigo de uns papéis, que,
inseparáveis, fomos unidos pela máquina. E a melhor das surpresas: tudo aquilo
estava ali só pra nos embelezar e nos deixar úteis de novo.
Virei folha de caderno, junto com os
meus amigos! Nunca tinha imaginado que era tão importante pra ter um tratamento
tão especial como esse!
Das prateleiras de uma loja fomos parar
nas mãos de um garoto. Éramos brancos, mas ele desenhou uma árvore cheia de
flores e frutos coloridos em cima da gente. Nos arrancou do caderno e nos
pregou numa parede. Estamos em uma sala onde sempre há crianças.
Até hoje elas se aproximam e ficam nos
admirando. Vocês podem acreditar nisso?!
De saquinho de pipoca à vida de artista!
Como sou feliz !